Fundação de São Vicente: Benedito Calixto
O Início da
Colonização do Brasil
A colonização do
Brasil começou em 1530 com a vinda, a mando da Coroa Portuguesa, de
Martim Afonso de Souza ao Brasil com a tríplice missão de
explorar a costa desde o Maranhão até o rio da Prata, impedir o
comércio dos franceses e fundar os primeiros núcleos de população
branca: São Vicente, a primeira vila (22 de janeiro de 1532), e
Piratininga, esta em terra firme.
Martim Afonso de Souza
mandou trazer à recém-fundada Vila de São Vicente figo, laranja,
limão, melão, couve, agrião, espinafre, chicória, mostarda,
coentro, trigo, hortelã, cebolinha, manjericão, alho, alfavaca,
gengibre, arroz, cana de açúcar, temperos da índia, bois, vacas,
touros, ovelhas, cabras, carneiros, porcos, galinhas e patos.
Foi em São Vicente,
que os portugueses iniciaram a plantação da cana-de-açúcar, o
cultivo da vinha, do trigo e de outras plantas, além da criação de
gado, mandado vir das ilhas de Cabo Verde.
Em 1530, com a
instalação da fábrica de doces, por Martim Afonso de Souza, doces
como a laranjada, aboborada e a marmelada puderam ser apreciados. Aos
poucos, a culinária paulista vai tomando forma, com a introdução
de preparações à base de cana de açúcar, trigo, marmelo,
laranja, figo e vinha de uva, além da carne de gado, inicialmente
vinda de outras regiões e, posteriormente, criada em nossa região.
A
culinária brasileira colonial primordial
Bandeirantes
Os portugueses são a
maior influência na formação da culinária brasileira. A mandioca,
o milho, os frutos e outros vegetais da nossa flora, assim como as
caças e os peixes compõem a contribuição indígena e os produtos
de origem africana foram trazidos ao Brasil pelos portugueses. Surge
assim o que podemos chamar de culinária brasileira colonial
primordial, na Vila de São Vicente, a primeira cidade brasileira,
fundada em 21 de janeiro de 1532. Pelos dois séculos seguintes
bandeirantes e tropeiros se incumbiram de difundir esta culinária
pelo interior do Brasil. Da Vila de São Vicente para São Paulo de
Piratininga e daí para toda a região compreendida pelos atuais
estados de São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Tocantins, Mato Grosso,
Mato Grosso do Sul e Paraná entradas, bandeiras, monções e tropas
difundiram a culinária brasileira colonial primordial.
Paralelamente, ao longo de toda a nossa costa surgem culinárias
locais, baseadas nos produtos locais com destaque para o uso dos
peixes e frutos do mar.
A mandioca
Os colonizadores
aprenderam rápido com os indígenas a importância da mandioca na
alimentação. Com a mandioca brava (Manihot
esculenta), venenosa, faziam o beiju (tapioca) e a farinha. Esta
última comia-se muito. Como prato único e completo ou acompanhando
peixes e frutas. Os indígenas misturavam a farinha de mandioca ao
caldo de carne para fazer o pirão.
As
Frutas
Os
indígenas não tinham o hábito de plantar frutas, já que dispunham
fartamente de uma grande oferta natural: abacaxi, goiaba, cajá,
maracujá, imbu, mamão, mangaba, caju entre outras. Caldos, bebidas
e mingaus eram feitos com o cozimento da banana-da-terra ou pacova.
Os
portugueses plantaram na Capitania de São Vicente o figo, a laranja,
o limão, o melão, o marmelo, a cana-de-açúcar, o coco e as
variedades africanas de banana, que serviam para se comer cruas. Nos
engenhos a cana-de-açúcar se transformava em açúcar e melaço.
As
mulheres portuguesas, aproveitando também do açúcar abundante dos
engenhos, começaram a criar incontáveis tipos das mais variadas
sobremesas.
Com os amendoins e as castanhas dos cajus as
portuguesas faziam os doces que originalmente levavam amêndoas e
pinhões em sua receita. Os cajus e as bananas-da-terra, cozidos com
açúcar e canela ou secos ao sol, também davam deliciosas
iguarias.
As massas de frutas ou marmeladas – porque
inicialmente eram preparadas com o marmelo – passaram a ser feitas
de uma enormidade de frutas como caju, banana, abacaxi, araçá,
goiaba, oiti e curuanha.
O
Milho
Inicialmente
com o milho se fazia o angu, a pamonha, o curau e a canjica, que os
portugueses incrementaram com o leite, o açúcar e a canela. Tempos
depois começaram a produzir a farinha de milho usada para acompanhar
outros alimentos, para fazer farofas e o cuscus.
Os
Peixes, Moluscos e Crustáceos
A pesca, de peixes,
moluscos e crustáceos, era realizada pelos indígenas com arco a
pequenas distâncias, sem haver uma espécie mais apreciada que
outras. Os maiores eram assados ou moqueados e os menores cozidos
sendo o caldo utilizado para fazer pirão. Por vezes, secavam os
peixes e socavam-nos até fazer uma farinha que podia ser
transportada durante viagens e caçadas. Os peixes eram ensopados,
grelhados na brasa ou enrolados em folhas, enterrados e cozidos sob
um braseiro. Os colonizadores também apreciavam estes alimentos e os
pratos preparados com eles.
As
Carnes
As principais carnes
eram as de mamíferos como o porco-do-mato, o queixada, o caititu, a
paca, o veado, macacos e a anta. As aves silvestres eram também
apreciadas. Os porcos, ovelhas, cabras, carneiros, galinhas e
patos trazidos por Martim Afonso foram os primeiros animais de
criação para consumo em terras brasileiras. Em 1534, Ana
Pimentel, esposa de Martim Afonso de Sousa, mandou à Capitania de
São Vicente bois, vacas e touros, enviados de Cabo Verde e que
passariam a fazer parte da dieta, como carne fresca e conservada
seca, salgada ou imersa em banha de porco. Assim os portugueses
agregaram aos indígenas e escravos africanos o hábito de consumir
leite vaca e de cabra e os ovos em doces e pratos salgados. Os
indígenas já tinham o hábito de grelhar caças e foi assim que
surgiu o churrasco gaúcho.
A
Galinha ao Molho Pardo ou de Cabidela
A
galinha ao molho pardo ou de cabidela, prato português com várias
versões na Europa, era muito apreciado no Brasil e veio compor a
culinária paulista à época da colonização.
O
Porco
Os indígenas tinham na
caça importante fonte de alimento. As principais carnes eram as
de mamíferos como o porco-do-mato, o queixada, o caititu, a paca, o
veado, macacos e a anta, que servia a comparações com o boi, a anta
estrangeira. Eram preparadas com pele e vísceras, o pelo queimado
pelo fogo e os miúdos, órgãos internos, depois retirados e
repartidos. O porco doméstico e outras crias foram sendo adicionados
à culinária paulista. Os paulistas em suas entradas, bandeiras e
monções, levavam a carne suína e bovina cozidas e imersas em banha
para consumo durante a viagem e, posteriormente, para abastecer as
povoações das regiões das minas. Após levarem porcos vivos e
galinhas para Vila Rica e os confins da grande Capitania de São
Paulo e das Minas de Ouro estes animais puderam ser criados
localmente. Foi assim também com os feijões, o arroz, a
cana-de-açúcar, o quiabo, a couve e outros alimentos. Estavam
criadas as condições para o desenvolvimento da rica culinária
mineira.
O leitão e o porco
cozido ou frito na própria banha, assado no forno ou no braseiro
eram tradições europeias assimiladas pela culinária paulista
caipira.
Leitão Pururuca
O leitão
pururuca deve ter surgido ainda no Brasil Colonia, e praticado
em São Paulo, Paraná e Minas Gerais, mas não temos registros
precisos de onde e quando passou a ser elaborado.
Vaca Atolada
Prato simples feito com
costela bovina (ou, na sua falta, outras carnes bovinas) cozida com
mandioca mansa. A carne fica atolada no creme de mandioca, daí o
nome do prato. Este prato surgiu em São Paulo e passou a fazer parte
da culinária do Paraná e de Minas Gerais à medida que os
desbravadores conseguiam fazer o gado bovino chegar a estas terras.
Os
Feijões
Os
feijões, que já eram utilizados pelos indígenas antes da chegada
dos descobridores e escravos, tiveram seu espaço na dieta de
portugueses e negros mas foi bem depois disso que veio a se tornar
integrante essencial à alimentação. Os portugueses passaram a
consumir o feijão nativo do Brasil, mas somente o brasileiro do
século XVI assumiu o habito de consumo acompanhado de peixes e
carnes. A farinha e o feijão são dois alimentos nativos brasileiros
que constituem ainda hoje a base da nossa alimentação.
O
Virado
Originalmente
o virado era feito com feijão cozido com caldo ao qual se
acrescentava farinha de mandioca. Era comida de comer com a mão. Aos
bandeirantes que se embrenhavam pelas matas em busca das minas de
ouro e ampliando o território brasileiro bastava levar o feijão e a
farinha de mandioca para produzirem um alimento bastante nutritivo.
O
Feijão Tropeiro
Tropeiro
é a designação dada aos bandeirantes que conduziam as tropas,
assim designadas as comitivas de muares e cavalos, que levavam
ferramentas para garimpar, instrumentos agrícolas, alimentos,
tecidos, açúcar, cachaça e outros bens da Vila de São Vicente e
São Paulo para Vila Rica, Mariana e outras localidade da Capitania
de São Paulo e das Minas de Ouro. De lá eles traziam o ouro que era
fundido em barras em Taubaté para então ser enviado para Portugal.
Os tropeiros também levavam as mulas criadas na região que é hoje
o Estado do Rio Grande do Sul pra serem vendidas em Sorocaba. Aos
tropeiros é atribuída a criação do prato denominado feijão
tropeiro.
Para
se fazer o feijão tropeiro deve-se fritar toucinho fresco ou
defumado cortado em cubinhos com linguiça cortada em rodelas e
reservar. O excesso de gordura é descartado e o que sobrar é usado
para se fazer um refogado de alho e cebola ao qual se junta o
toucinho e a linguiça fritos, feijão cozido com caldo e farinha de
mandioca ou de milho ou uma mistura das duas. Cozinha-se bem,
acerta-se o sal e pronto. Se quiser pode acrescentar cheiro verde
picadinho.
O
Tutu de Feijão
É
uma variante do feijão tropeiro. A diferença é que no tutu o
feijão é amassado (e hoje batido no liquidificador) reduzindo o
feijão a uma pasta. De resto o jeito de fazer é praticamente igual
ao feijão tropeiro.
Os
Temperos
Os
índios já tinham o hábito de usar pimentas e acrescentavam sal aos
seus alimentos. A mostarda, o coentro, o hortelã, a cebolinha,
o manjericão, o alho, a alfavaca, o cravo-da-índia e a canela foram
trazidos pelos portugueses à Capitania de São Vicente. Da África
eles trouxeram a erva-doce, o gengibre, o açafrão da terra e o
gergelim. Cultivados em solo brasileiro seu uso se espalhou pelo
Brasil e usados no preparo de pratos doces e salgados.
O
Arroz
O
arroz foi trazido ao Brasil e passou a ser cultivado na Capitania de
São Vicente. Ele só passou a ser largamente consumido no século
XVIII e, ainda assim, na consistência de papa ou pirão com água e
sal para acompanhar carnes e peixes. A partir da contribuição dos
negros, dos índios e dos brancos inúmeros pratos de arroz começaram
a ser criados como o arroz de haussá, arroz de forno, arroz de cuxá
e arroz de piqui entre outros. Em forma de doce temos ainda mingaus
de arroz, bolos, pudins e o arroz doce feito de leite de gado ou
coco.
O
Cuscuz
O
cuscuz, prato do norte da África, inicialmente era elaborado com
sêmola de trigo. No Brasil Colonia era feito com farinha de mandioca
e depois com farinha de milho. Os africanos o umedeciam com leite de
coco e os portugueses com leite de vaca. Os paulistas desenvolveram
uma versão salgada do prato.
A
Cachaça e a Caipirinha
Os
livros de história são unânimes em afirmar que o primeiro lugar a
produzir aguardente foi a Capitania de São Vicente, onde hoje fica o
estado de São Paulo, já que lá é onde estava instalado o primeiro
engenho real de cana. Em 1584, Gabriel Soares faz o relato de que já
existiam 8 casas de "cozer mel" como eram chamados os
engenhos que produziam a cachaça, bem antes dos ingleses iniciarem a
produção de rum no Caribe em um processo assemelhado.
Os
escravos gostavam também da garapa, o caldo-de-cana não fermentado
e quando possível animavam as festas com cachaça que até em parte
dada para os espíritos do mortos. Os sucos de fruta misturado à
cachaça originou a famosa "batida". A mais famosa era a
batida-de-limão que podemos considerar como a a proto-caipirinha,
faltando os pedaços de limão com casca que dariam a caipirinha o
seu gosto original.
Pouco
se conhece sobre a origem da caipirinha. Muito provavelmente, a
mistura de cachaça, limão amassado, açúcar e gelo nasceu no
interior do estado de São Paulo. Qualquer bebidas com ingredientes
diferentes destes não deve e não pode ser chamada de caipirinha. É
nosso dever não aceitar que se dê o nome de caipirinha a bebidas
preparadas com vodka ou rum ou excentricidades absurdas como
“caipirinha de saquê com lichia”. Caipirinha se faz com cachaça,
limão tahiti ou galego, açúcar e gelo.
Outras culinárias do Brasil Colonial
Durante
todo o Período Colonial em outras regiões do Brasil outras
culinárias foram se desenvolvendo.
No
Sul a expansão da criação do gado bovino determinou o
desenvolvimento do churrasco gaúcho, que começou com a costela no
fogo de chão e se diversificou em cortes e maneiras de assar a
carne. O charque e o arroz de carreteiro também são contribuições
gaúchas à nossa culinária.
No
Norte temos a mais forte influência indígena na culinária local
com o intenso uso da mandioca, dos peixes e da vegetação local.
No
Bahia temos a mais forte influência africana com ênfase para a
utilização dos peixes e frutos do mar, do coco e do leite de coco,
do quiabo, do azeite de dendê e das pimentas.
No
Nordeste acima da Bahia a rapadura, produzida nos engenhos de
cana-de-açúcar, as carnes seca e de sol, os peixes, a sempre
presente farinha de mandioca e outros vegetais locais deram
identidade à culinária nordestina da época do Brasil Colônia.
A
culinária mineira começa a assumir identidade própria a partir da
criação da Capitania de Minas Gerais que se desligou da Capitania
de São Paulo e Minas de Ouro e teve como capital Vila Rica, hoje
Ouro Preto.
A
influência da vinda da família real nos hábitos de comer e beber
dos brasileiros
Chegada
da Família Real ao Brasil
Temendo
a invasão de Napoleão a Portugal, o Príncipe D. João fugiu para o
Brasil com uma caravana de aproximadamente quinze mil pessoas. Isso
motivou a vinda de muitos ingredientes de Portugal ao Brasil para
servir à corte como agradasse. Espécies brasileiras como o macuco,
a galinhola, o marreco, a paca, o veado, a anta, a cutia e o
porco-do-mato foram valorizadas. Novos alimentos surgiram como a
carne de fumeiro, os embutidos e as frutas cristalizadas feitas com
variedades brasileiras. O pão de trigo se tornou mais comum e usual
e os cardápios passaram a incluir saladas.
As bebidas
apresentavam exemplares do vinho português, do champagne e, o que
mais se popularizava, a cerveja. Havia também o aluá feito da
fermentação da casca do abacaxi.
A
alimentação brasileira se diversificava com os vinhos franceses,
cervejas, patês de foie gras, conservas, queijos, doces, novas
frutas, licores ardentes e adocicados. Chá era bebida para ricos e o
cacau exportado voltava como chocolate. Originaram-se as
confeitarias, sorveterias e os primeiros restaurantes italianos e
franceses.
O café tinha sua produção em alta e chegou a ser
o produto mais exportado do Brasil e, naturalmente, seu uso se
espalhou também internamente, chegando a dar nome à primeira
refeição do dia.